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ONG: falta de fiscalização ameaça patrimônio em Petrópolis

Um dos sobrados atingidos pela decisão da Justiça de anular o decreto de tombamento Rolland Gianotti / O Globo

Um decreto que regulamenta o zoneamento — e, consequentemente, as construções — é o instrumento apontado pela Associação Amigos de Petrópolis (Apande) para garantir a preservação dos bens tombados pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural na cidade. Centenas de imóveis tombados pelo Inepac ficaram ameaçados após uma decisão do juiz da 4ª Vara Cível de Petrópolis, Alexandre Teixeira, que anulou no mês passado um processo administrativo do órgão estadual.

A representante da Apande, Fernanda Colagrossi, que iniciou a campanha pelo processo de tombamento agora anulado pelo Judiciário, afirma também que, apesar da polêmica decisão, todos os imóveis tombados pelo Inepac estão em área de entorno de bens tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e são protegidos ainda pelo decreto nº 90, de 25 de junho de 1981, que regulamenta o zoneamento.

— Se estão pensando em demolir os imóveis tombados em Petrópolis para, em seu lugar, instalar prédios altos ou imóveis maiores, as pessoas vão se decepcionar. O decreto 90 trata do zoneamento da cidade e dos bens tombados em três níveis (municipal, estadual e federal) — disse Fernanda Colagrossi.

Fernanda Colagrossi frisa que o decreto municipal nº 90 determina, que se o imóvel tombado for derrubado ou destruído e os proprietários quiserem erguer outro em seu lugar, ele deve ser menor do que o anterior:

— Podem até conseguir derrubar, mas nada maior poderá ser construído, pois o decreto estabelece que o novo imóvel deve ter volumetria menor.

Ela anunciou que a Apande vai ingressar com um processo contra a decisão da 4ª Vara Cível:

— Petrópolis sofre muito com a especulação imobiliária. Estamos contratando um advogado para questionar a decisão deste juiz distraído, que não avaliou as consequências dos seus atos — completa.

Críticas à fiscalização

Assim como Associação de Moradores e Amigos do Centro Histórico e o Instituto Civis, a representante da Apande critica a falta de fiscalização para a preservação dos bens tombados em Petrópolis.

— Temos uma fiscalização que é falha e que não consegue impedir a descaracterização do patrimônio da cidade. Um veículo com fiscais circulando pela cidade seria suficiente para conter abusos, mas isso não existe hoje em Petrópolis — lamenta Fernanda.

— Petrópolis sofre há muito tempo com a falta de fiscalização em todas as esferas — acrescenta a representante da AMA-Centro Histórico, Myriam Born.

Sem fiscalização por parte dos órgãos de preservação, ou incentivos por parte do poder público, imóveis são descaracterizados ou degradados pela ação do tempo. No caso do imóvel da Rua Coronel Veiga que deu origem à anulação do tombamento, as herdeiras informam no processo que não têm condições financeiras para manter a casa e que, por isso, decidiram vendê-la.

O tombamento, no entanto, foi um entrave para levar a venda adiante. A família, então, protocolou, na Secretaria Estadual de Cultura, pedido de revisão do tombamento, mas não obteve resposta.

Diante do impasse, em 2011, a família resolveu recorrer à Justiça. “Diversas corretoras de imóveis ofereceram pretendentes, que normalmente desistem da compra em função das restrições criadas pelo tombamento”, alegou o advogado Marcus Lima, que representa os donos da casa da Rua Coronel Veiga, no pedido de abertura da ação judicial.

 

 

 

Centro do Rio é o motor econômico da cidade

Região concentra 25% do emprego e tem salário médio de R$ 3.577

Clarice Spitz

Apesar da expansão imobiliária da cidade rumo à Zona Oeste, o Centro ainda é o motor econômico do Rio de Janeiro. Com a presença de estatais, sedes de grandes empresas e boa parte do comércio, o Centro detém um quarto do emprego da cidade (25,37%), e o salário médio é o oitavo maior entre os mais de 160 bairros: R$ 3.576,98. Se acrescentada a zona portuária, que abrange Gamboa, Saúde, Caju e Santo Cristo, a região passa a concentrar 37% do emprego da cidade, bem acima da Zona Oeste. As informações fazem parte do levantamento feito pelo professor de Economia da UFRJ Mauro Osório que mapeia o rendimento na capital, com base nos dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais).

Os números mostram que o plano do arquiteto e urbanista Lúcio Costa de implantar na Barra da Tijuca um novo centro da cidade ainda parece longe de ser realidade. A Barra e o Recreio concentraram 31,4% dos lançamentos residenciais e comerciais de 2013, segundo dados da Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi). Apesar disso, a Barra tem apenas o 24º salário da cidade, em média: R$ 2.467,32, o que pode estar ligado à grande concentração de comércio. A participação no emprego também é modesta. A região da Barra, Recreio e Jacarepaguá responde por somente 7% do emprego da cidade.

– A centralidade da Barra é muito menor do que as pessoas imaginam. Atualmente, procura-se adensar as cidades pelo seu centro e isso é racional, para reduzir a mobilidade obrigatória. Como a tendência da população é não crescer mais, não faz sentido as pessoas morarem longe do trabalho – afirma Osório.

O economista Leonardo Muls, da Universidade Federal Fluminense (UFF), lembra que o fato de o Centro concentrar dinamismo tem origem histórica. Na época em que o Rio era a capital do país, atividades administrativas e estatais predominavam na região.

– Quando o Rio deixou de ser capital, não houve planejamento econômico para o entorno da cidade. Mas o Centro ainda precisa virar um pouco do que é hoje Botafogo, crescer em termos de oferta de padarias, cinemas e de todo tipo de serviços – afirma Muls.

Segundo o levantamento de Osório, mesmo bairros que passaram a abrigar gestoras e bancos de investimento, como o Leblon, ainda estão longe de ocupar as primeiras posições no ranking da renda. O Leblon detém apenas o 32º lugar, com um salário que, em média, é de R$ 2.254,13.

Para o professor José Cezar Castanhar, da FGV Projetos, as obras do Porto Maravilha aumentam a tendência de concentração no Centro da cidade.

– Existe um movimento global neste sentido, algo que já aconteceu em Lisboa, Buenos Aires. Mas houve, sim, um crescimento para a Zona Oeste e hoje existe um paradoxo, porque as pessoas foram para lá acreditando que, do ponto de vista dos negócios, a Barra tivesse condições de competir – pondera.

Cidade Universitária tem maior salário

O mapa do rendimento no Rio mostra ainda que centros de pesquisa ajudam a elevar a renda. Encabeçando a lista, o maior salário é o da região da Cidade Universitária, onde a média fica em R$ 7.313,47, seguida por Manguinhos, com renda média de R$ 4.754,63.

Bairros da Zona Sul, como Jardim Botânico e Botafogo, também estão entre os dez maiores salários médios graças ainda a institutos de pesquisa. O Jardim Botânico aparece em terceiro no ranking, ao abrigar grandes empresas e o Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), além do próprio Jardim Botânico. O salário médio é de R$ 4.118,84. Botafogo está em sétimo: R$ 3.631,23.

A ideia de que apenas o setor de Serviços comanda a economia da cidade é outro equívoco, na opinião de Osório. O Rio ocupa a segunda posição na renda gerada em Serviços, de acordo com os dados mais atualizados divulgados pelo IBGE sobre o PIB dos Municípios. Para ele, ainda é grande o peso do rendimento industrial no total da renda. Isso acontece em Jacarepaguá, na Zona Oeste, onde o emprego industrial influencia a renda de trabalhadores. A região detém 17.484 empregos industriais diretos e está em nono na média geral de rendimentos: R$ 3.531.

O petróleo influencia os salários no Centro e no Maracanã. Só o Maracanã ocupa a quinta colocação no ranking de salários, com uma média de R$ 3.939,42 por trabalhador.

– O petróleo não se restringe à extração, mas também à indústria naval, que tem crescido fortemente na Região Metropolitana do Rio, além de todo aumento de empresas de partes e peças e prestação de serviços também vinculada ao complexo de petróleo e gás – afirma Osório.

Menos deslocamentos

A EcoSistemas, empresa de tecnologia especializada em softwares na gestão de saúde, está de malas prontas para se mudar este mês de Niterói para o Rio de Janeiro. Passará a ocupar dois andares de um prédio comercial numa área de 1.700 metros quadrados na Rua Dom Gerardo, em um investimento de R$ 2,5 milhões. O presidente da EcoSistemas, Marco Aurélio Duarte, espera que, com menos deslocamentos de funcionários, a receita aumente em 30% até 2015.

– É uma aposta que estamos fazendo. O Centro é uma área que movimenta toda cidade. Queremos aproveitar a convivência dos funcionários e dividir conhecimento. O Porto Maravilha pode nos levar mais adiante – estima Duarte.

Beltrame sugere reforma urbanística.

ENTREVISTA  – JOSÉ MARIA BELTRAME

UPP – ANESTESIA PARA A CIRURGIA DA TRANSFORMAÇÃO

Kalinka Iaquinto, do Rio de Janeiro

Depois de sete anos à frente da articulação da política de segurança que instalou as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em favelas cariocas, José Mariano Beltrame suscita um novo debate. Propõe que os poderes constituídos e a sociedade quebrem um tabu e discutam, sem ideologia político-partidária, uma reforma urbanística nessas localidades. Entre meando a conversa com seu jeito de falar gaúcho, Beltrame defende que o afastamento da criminalidade, está diretamente ligado a mudanças estruturais nas comunidades, que, segundo ele, da forma como estão, são propícias a esconder criminosos, armas e drogas. Refuta a ideia de que favelas são, sempre, casos de polícia ao defender que os demais serviços, como saúde e educação, cheguem aos morros. Por isso, diz que as UPPs são uma anestesia para a cirurgia das transformações. O secretário sugere a criação do Ministério de Segurança Pública e anuncia que não pensa em sair candidato nas próximas eleições “nem aqui, nem no Congresso, nada”. Conjuntura Econômica — No mês passado, as UPPs completaram cinco anos de existência. Como avalia a iniciativa e quais os desafios futuros?

José Mariano Beltrame — Olhando para trás, eu vejo uma infinidade de aspectos positivos. Acho que — vou usar uma expressão que eu já usei — a segurança pública criou nessas áreas uma oportunidade para que aqueles lugares, efetiva mente, sofressem e sofram uma transformação. Transformação essa que vá desde a cidadania para as pessoas, passando por assistência social, por saúde, por todos os aspectos que envolvem cidadania e, sem dúvida nenhuma, até para dar uma nova cara pra esses lugares. Para uma mu dança da configuração urbana das favelas. Uso uma expressão, que não seja mal interpretada, mas a UPP é uma anestesia para que se proceda a uma grande cirurgia. A UPP é uma oportunidade para que aconteça uma série de outras coisas que acontecem nos outros lugares da cidade.

CE – E quando o senhor sugere essa grande cirurgia…

JMB – É a verdadeira transformação, a verdadeira integração dessas áreas com o restante da cidade. E penso que essa cirurgia deve, inclusive, tocar no aspecto da configuração geográfica da urbanização. Mexer na favela. Isso é um tabu aqui no Rio de Janeiro. As pessoas enchem esse assunto de ideologia político-partidária e discutem isso ideologicamente, mas acho que é um tabu que a sociedade tem de discutir e chegará conclusão de que o estado não vai conseguir fazer tudo.

CE – Um tabu ou, além de um tema espinhoso, há por trás disso certo comodismo?

JMB – Acho que é um tabu mesmo. Um assunto muito recheado de política partidária, ideologia. Porque veja bem uma coisa, você pode ter o melhor serviço de assistência à tuberculose embaixo da Rocinha — onde temos os maiores índices da doença no Brasil —, aquele hospital ali não vai resolver o problema da tuberculose. O que vai resolver é abrir a Rocinha, arejar a Rocinha, é fazer o ar correr e o sol chegar.

CE – E como conseguir isso? Como ultrapassar essa barreira?

JMB – Penso que por meio de um grande pacto, de um grande entendimento de toda a sociedade, envolvendo os poderes públicos, Judiciário, Legislativo, Executivo, a sociedade, no sentido de dar essa nova cara para esses lugares. E há que se ter pressa para resolver isso. Disse numa entrevista: o que vai ser de uma favela dessas daqui a 20 anos? Isso tem que ser resolvido porque as pessoas acham que o Poder Executivo resolve tudo. Eu conheço o Hudson Braga, da Emop (secretário de Obras do estado, que tem sob sua pasta a Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro), que tem 211 ações na Justiça contra ele por estar fazendo obras públicas. Recorrer é um direito que a pessoa tem, e o Estado democrático acata o direito dessa pessoa. O teleférico aqui da Providência está parado por causa de uma ação judicial. Porque aquela pessoa foi na Justiça e obteve seu direito de não ser importunado por aquela obra. Então, em vez de se abrir uma avenida, que custa muito mais barato, você vai fazer um teleférico que tem o custo alto, que tem um custo de manutenção mensal altíssimo. Está na hora de todos nós discutirmos isso. Tem de haver um tratamento diferenciado, especial, para poder integrai por que senão vai ficar sempre na anestesia.

CE – E esse tratamento diferenciado passa por uma revisão da forma como atuam o Legislativo, o Judiciário e o próprio Executivo?

JMB – Esses poderes têm de vir para essa conversa para ver que, sem dúvida nenhuma, uma pessoa que está pleiteando algo na Justiça tem esse direito, mas, em contrapartida, será que quantas outras centenas de milhares de pessoas não seriam beneficiadas? Por isso, o tema não pode ser visto como tabu. Se eu tenho uru cano de água potável para subir e esse cano vai e para em uma casa, será que não dá para mudar essa casa de endereço para beneficiar 40 mil pessoas? Agora, a pessoa pode entrar na Justiça, tem esse direito. Sei que tem pessoas que, politicamente, podem comprar a briga desse morador, então acho que tudo isso tem que ser arrumado, discutido de uma maneira séria para que se resolva realmente esse tipo de problema. Na calçada aqui da secretaria há uma rampinha para um paraplégico descer, como é que “tu tira” um paraplégico do alto do Morro da Formiga? Vejo que são transformações absolutamente necessárias, mas que acabam sempre no resultado da anestesia: polícia, polícia, tudo cai no punitivo. Esses lugares, como eles estão, sempre vão servir para bandido se esconder, para esconder armas, drogas, munição, e a questão vai “arrodear” sempre em polícia, polícia, polícia.

CE – As pessoas e os poderes constituídos têm de se conscientizar de que agora a manutenção da segurança e novos avanços não são mais problemas apenas da polícia.

JMB – Exatamente. E têm que abordar isso com seriedade, isento de qualquer política partidária e de ideologia. Botar em jogo o interesse público.

CE – A forma como o tráfico atuava nas comunidades era a questão mais polêmica do Rio. Depois das UPPs, houve diminuição da atividade das facções?

JMB – Teve, o tráfico ficou meio sem alternativa, mas, obviamente, o crime se reacomoda de outra forma. Mas, teve, sim, um impacto considerando que os verdadeiros bunkers, os verdadeiros QGs foram atingidos, corno Rocinha e São Carlos, que eram da ADA (Amigos dos Amigos), e Vila Cruzeiro e Alemão, do Comando Vermelho.

CE – Essas pessoas migraram para outras comunidades ou cidades?

JMB – Muito poucos migraram porque são pessoas com pouca renda, pobres e que, muitas vezes, não têm como ser recebidas em outro lugar. E os chefões, muitos nós prendemos, outros migraram, não tenha dúvida. Porque quem migra é aquele que tem condição de fazer isso. Assim como o Fabiano (Fabiano Atanázio da Silva, o FB, que chefiava o tráfico de drogas nos complexos da Penha e do Alemão) que foi pra São Paulo e a gente conseguiu prender. Os que escondiam armas, armazenavam drogas, que “endolavam” (embalar drogas para a venda), esses vão ter que ficar ali. Viviam com R$ 10, R$ 15. Esses, por vezes, podem tentar alguma coisa, mas aí eles vão encontrar a polícia. E, só para te dar um dado interessante, “tu sabe” que as UPPs hoje são as responsáveis pelo maior número de prisões? Prendem mais que os batalhões, mais que as delegacias. Mas, é aquela coisa, cinco papelotes (pequeno embrulho de papel ou plástico com cocaína), quatro papelotes, 10 gramas.

CE – Os resultados são atribuídos à própria ação dos policiais ou a população está mais à vontade para denunciar?

JMB – Infelizmente, o tráfico há umas décadas era aquela história: o cara da Zona Sul ia buscar a droga, hoje é para consumo interno. Lugares como a Rocinha têm consumo interno e São Carlos, Maré e Jacaré também. Então antes era “ah, o cara vai lá buscar”. Hoje, além de ir buscar, tem o consumo interno.

CE – A política de segurança adotada pelo estado na capital é tida por muitos como um case de sucesso. O senhor acredita que o modelo poderia ser adotado em outras capitais?

JMB – Acho que se pode tirar algumas coisas da UPP, mas ela é muito carioca. É para uma realidade nossa. E algo como o nosso “tu não vai” encontrar no mundo. A problemática do Rio de Janeiro eu nunca vi em outro lugar. Acho que muitos dos problemas de segurança pública no país — e na própria América Latina — se resolveriam com essas questões de cidadania. Só que aqui não. Aqui como eram bunkers, ilhas, tivemos primeiro que entrar com a força policial forte. Mas acho que em outros lugares pode-se fazer o contrário. Como a gente diz: dar um “banho de loja” no lugar.

CE – Recentemente o senhor defendeu a criação de um Ministério de Segurança Pública…

JMB – Sim, antes eu não pensava, agora eu penso que sim.

CE – De que maneira o senhor, como articulador de uma política de sucesso, poderia influenciar para que isso se efetivasse?

JMB – O atual governo não pensa nisso, mas acho que deveria pensar. Isso foi retirado da Constituição em 1988. Nossos legisladores deixaram isso para os estados e educação e saúde como sendo da competência federal, segurança ficou fora. Isso foi um erro, embora a gente tenha uma das melhores constituições do mundo. Naquela época ninguém queria falar de segurança, era sinônimo de repressão, então todo mundo deixou aquilo de lado, passou para OS estados e os estados pegaram e também deixaram aquilo meio de lado. Meio que militarizaram isso. Os militares é que davam aula, a polícia militar é paramilitar e “tu teve” aí uma polícia civil que também se infiltrou um pouco dessa lógica. Em função disso, não tem administradores de segurança pública, nem especialistas nessa área. Nós mesmos aqui fizemos uso de consultoria externa. Acho que isso foi um erro e que esse erro pode ser reparado com um ministério. E vejo o ministério com quatro, cinco ou seis linhas mestras. muito grande para você querer que uma política de segurança do Rio de Janeiro caiba dentro do Pará. Mas tem coisas que são plenamente possíveis de usar como nacional: campanha para redução de homicídios, quem sabe um sistema de comunicação, um sistema de inteligência, algo assim. Cinco ou seis projetos grandes. O ministério seria uma maneira de um dia estar sentado à frente do presidente da República e, efetivamente, esclarecer como essas coisas acontecem. Porque são muito diferentes as realidades das capitais brasileiras. Muito diferentes.

CE – Falando em diferenças, aqui no Rio o senhor adotou um novo modelo para as polícias, dando ênfase a novos policiais. Há críticos dizendo que isso poderia supor que o problema que víamos entre as polícias estaria somente na formação do policial. Como o senhor avalia as críticas?

JMB – Todas as críticas que a gente lê, ouve, assiste, são observadas. Nós temos uma subsecretaria de capacitação, ensino e educação que é a responsável pela mudança. Mudamos todo o currículo das polícias, levando uma polícia voltada para o nosso cliente, que é o cidadão. Hoje, a gente tem um currículo totalmente novo, adaptado a essa realidade. Mas ternos um problema muito sério no Rio de Janeiro que é a história do Rio, muito ruim em termos de violência. A sociedade se afastou da polícia e a polícia se afastou da sociedade. E isso não foi em vão porque a polícia entrava nesses lugares para fazer guerra, que tem todo um legado, um resultado muito ruim. A UPP acaba com a guerra, e a consequência é que a presença daquele policial novo ali comece, aos poucos, a Porque esse país é inverter isso. As pessoas veem que o policial está ali para ajudar, para fazer amizades e isso “tu percebe” bem nas UPPs mais antigas e menores. Nas que ocupamos mais recentemente e são maiores, é óbvio que esse processo é muito mais difícil. Sobre a crítica, sempre vão ter pessoas especializadas em ver as diferenças e não as igualdades. A gente observa todas elas, agora, não vamos mudar esse quadro de 40 anos e a história e as mazelas das polícias em dez anos. Não tenho essa pretensão. A academia mudou, em maio fizemos um ano de um currículo total mente novo, professores que são pagos. Antes professores não eram pagos e hoje se paga R$ 65 a hora aula, acho que é um dos melhores valores pagos. Quando vamos ler os resultados disso? Talvez daqui a quatro ou cinco anos é que vamos ver os resultados do comportamento desses novos policiais. Mas, repito, temos uma história muito difícil. Acho que para se ajeitar o Rio de Janeiro, a gente talvez perca uma geração.

CE – A maioria desses policiais é do Rio? Então eles também têm em si essa cultura que vemos na população.

JMB – A maioria desses policiais é do Rio, são filhos dessa sociedade. Não posso trazer um policial lá do interior de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul ou de Marte para ser policial aqui. Ele é fruto dessa sociedade, ele é filho daqui.

CE – Ele também tem que ser conscientizado…

JMB – Sei que isso pode ser meio “pinguim de geladeira”, mas acredito muito em apertar lia formação, capacitar, procurar pagar melhor — nós demos mais de 120% de aumento para os policiais nesses sete anos —, você mostra para ele os horizontes da carreira, mas tem muita coisa que se traz de casa, aquela coisa dita pelo pai e pela mãe que você não deve fazer. Eu, se faço uma coisa errada, fico vermelho.

CE – O senhor volta a essa questão. Qual o passo inicial para que, de fato, se converse sobre isso?

JMB – O passo inicial foi dado. As UPPs fertilizam esse território para que ali cresça alguma coisa, e o secretário está nas brigas, agora, o secretário não pode levar isso sozinho. As pessoas têm que acordar para isso. Não adianta todo mundo querer um policial em cada esquina para chamar de seu. Quem ocupou a Normandia e acabou com a guerra foi o exército dos aliados, mas quem fez o Plano Marshall e recuperou a Europa foram outras cabeças, outras pessoas. Acho que aqui nós estamos tendo essa oportunidade e nós nau podemos perdê-la. Hoje, tudo é assim, se discute e vira e mexe, polícia. As pessoas esquecem que nas regiões têm mora dores de rua, bocas de fumo fechadas dez vezes, pessoas com até cinco reincidências, pessoas residindo em habitações totalmente insalubres, algumas, quem sabe, até condenadas. Então tem uru monte de aspectos periféricos que não são discutidos. A questão central é sempre a reação de punir, punir, punir, e aí é polícia.

CE – Oferecer cidadania a essas pessoas quebraria o ciclo.

JMB – Sim. Obviamente nós não vamos ter polícia que chegue à cidade. Na favela é a mesma coisa. Se você não proporcionar serviços lá como acontecem aqui cm baixo, também vai ser difícil, as favelas vão ser sempre esconderijo, vai ter sempre lixo atirado, vai ter sempre um cano d’água que não passa, um esgoto que faz uma curva aqui e ali e se inviabiliza tecnicamente. Vai ter sempre uma ação judicial para impedir isso, e as pessoas vau colocar a culpa no poder público, mas na verdade não é do poder público, mas do judiciário que atendeu uma demanda, legítima, de um cidadão. Então, se não se sentar e discutir ponto por ponto… Estamos tendo a oportunidade de fazer isso. Antes das favelas ninguém falava por que “ah não, lá tem o tráfico, lá não pode”, era uma coisa fora do contexto, agora ela está dentro do contexto.

CE – Neste ano teremos a instalação de mais UPPs. Algum desafio específico?

JMB – Vamos chegar às 40 prometidas, mas a gente já planejou mais alguma coisa para frente, para se alguém estiver aqui quiser tocar. Hoje, a UPP está dada, não tem novidade, é isso aí. A PM (Polícia Militar) já sabe fazer isso sozinha. Nosso foco agora é investir cada vez mais em capacitar e preparar o policial para lidar com a população, porque esse resgate é fundamental. Acabar com esse afastamento que a guerra trouxe. Temos que investir e acho que aí sim temos muito que caminhar na preparação do policial, no diálogo.

CE – E para o resto do estado, quais os planos, os desafios?

JMB – O plano que temos é nosso planejamento estratégico. A gente conseguiu dar às academias um volume intermitente, então entram policiais todos os meses e saem policiais todos os meses. Isso vai nos permitir fazer as UPPs restantes, mas nós vamos continuar com essa formação que vai nos permitir recompletar os efetivos dos batalhões. Nós não temos o efetivo ideal em nenhum batalhão do estado do Rio de Janeiro. Então, esses policiais vão sair e recompletar os batalhões. Pretendemos também diminuir as áreas de atuações dos batalhões. Como, por exemplo, temos o batalhão de Paraty, mas a área dele vem até Mangaratiba. Isso é uma maluquice. O projeto UPP feito, com batalhões recompletados, vamos partir para divisões circunscricionais menores desses batalhões.

CE – O senhor não pensa nas eleições? Em uma vaga aqui ou no Congresso?

JMB – Não, não. Nem aqui, nem no Congresso, nada.

Arrumando a casa

Após o boom do mercado imobiliário, preços ainda sobem nos principais mercados do país, mas algumas cidades apresentam problemas pontuais

Daniel Vasques Clara Roman

Logo depois do boom de lançamentos do mercado imobiliário – que teve o pico em 2010 e 2011 – e a disparada dos preços, começaram os questionamentos sobre até onde iria essa subida.

Mesmo com uma revisão de estratégias por construtoras e incorporadoras que começou em 2012 e prosseguiu em 2013, os preços continuam a subir acima da inflação.

Na capital paulista, houve até aceleração na alta, com o crescimento de 21,6% no acumulado até novembro sobre um acréscimo de 10,8% em 2012, segundo pesquisa da empresa de informações imobiliárias Geoimovel.

No entanto, o novo Plano Diretor, que deverá entrar em vigor em 2014, gera incertezas. O projeto prevê estímulos à construção de empreendimentos em eixos bem servidos por transporte público, o que, em tese, tornará essas áreas mais baratas, e as distantes, mais caras.

“Prever ainda é sinônimo de adivinhar, e o Plano Diretor a gente já viu e discutiu, mas só vai saber lá na frente [depois de aprovado] seu efeito nos preços”, diz Eduardo Zaidan, vice-presidente do SindusCon-SP (sindicato das construtoras).

Para Claudio Bernardes, presidente do Secovi-SP (sindicado do mercado imobiliário), só há queda em casos pontuais. “Ninguém produz para vender com prejuízo.”

Assim como em São Paulo, os preços subiram mais em 2013 do que em 2012 em Belo Horizonte, Porto Alegre e Curitiba. No Rio e no Recife, os imóveis também ficaram mais caros, mas com alta inferior à do ano anterior.

TERRENOS

Na avaliação de Sérgio Freire, presidente da imobiliária Brasil Brokers, a dificuldade de achar terrenos é um dos fatores que podem manter esse ritmo acima da inflação no próximo ano.

Já em Brasília, houve uma forte queda de 35,5% (veja texto nesta página) e, em Salvador, os preços tiveram uma leve redução, de 2,9%.

Segundo Murilo da Rocha Correia, diretor da Lopes Bahia, existe um número alto de empreendimentos em fase de entrega gerando estoque acima da demanda em alguns bairros. Isso aconteceu porque grandes empresas de capital aberto tinham metas de lançamento que tentaram atingir “de qualquer modo”, segundo Celso Amaral, diretor da Geoimovel.

Como consequência da oferta maior que a procura, há incorporadoras anunciando promoções agressivas.

DESEQUILÍBRIOS

Segundo Ana Maria Castelo, coordenadora de estudos de construção civil da FGV (Fundação Getulio Vargas), não há risco de bolha de uma forma sistêmica, mas há alguns mercados com desequilíbrios de oferta e procura.

A visão é compartilhada por João da Rocha Lima Jr., coordenador do núcleo de mercado imobiliário da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

“Houve em alguns locais um exagero por parte das empresas, que foram construindo sem enxergar a demanda que viria adiante”, diz. Um estudo feito pelo seu núcleo indica que Salvador tem estoque de unidades que representa 2,7 vezes a demanda.

No segmento de imóveis comerciais, ressalta, a perspectiva é de queda. Na capital paulista, o aluguel de escritórios corporativos recuou 10% no terceiro trimestre ante igual período do ano passado, segundo pesquisa da consultoria Colliers International com espaços de mais de 100 m² e alugados, em geral, por grandes empresas.

Nesse intervalo, a área total disponível para locação quase quadruplicou.

A partir de 2012, aponta a consultoria, o mercado saiu de um período de expansão para superoferta, o que levou à redução de preços.

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