Mobilidade urbana – R$ 143 bilhões para obras

Programa tem mais de R$ 143 bi para obras

Paulo Vasconcellos

A aposta do governo com o Programa de Mobilidade Urbana é alta. “Estamos preparando as cidades de até 400 mil habitantes para se tornarem grandes de forma planejada, com transporte de qualidade e seguro, para que se possa tirar os carros das ruas”, diz o secretário Nacional dos Transportes e da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades, Júlio Eduardo dos Santos.

Mais de R$ 143 bilhões estão reservados a projetos em oito das doze cidades-sede da Copa do Mundo, em 14 municípios com mais de 700 mil habitantes, incluindo mais quatro cidades-sede do mundial, além de 26 que têm mais de 400 mil moradores. Antes do PAC da Mobilidade Urbana, anunciado em junho do ano passado pela presidente Dilma Rousseff em resposta aos movimentos sociais que foram às ruas protestar contra o aumento das passagens de ônibus e contra os gastos com a Copa do Mundo, estavam previstos R$ 93 bilhões para o setor. Com o PAC foram incluídos mais R$ 50 bilhões.

A diretriz do Programa de Mobilidade Urbana é desenvolver ações para requalificar, implantar e expandir sistemas de transportes públicos coletivos, além de induzir a promoção da integração modal, física e tarifária de forma sustentável e acessível. A atuação do governo federal no setor da mobilidade urbana nos últimos anos vem sendo implantada para atender à Política Nacional de Mobilidade Urbana, instituída pela Lei 12.587, de 3 de janeiro de 2012. O foco da política é colaborar para o acesso universal à cidade, com a promoção de condições que auxiliem no desenvolvimento urbano. Entre as medidas previstas está o planejamento dos meios de transporte, serviços e infraestrutura que garantam os deslocamentos de pessoas e cargas no território urbano.

“A política definida pela lei visa projetos estruturantes que privilegiem metrôs e corredores de ônibus e que deixem os carros em segundo plano. A Copa do Mundo é um marco importante não só pela importância do evento e pelo legado, mas porque mudou a política de Estados e cidades sobre a mobilidade urbana. Ninguém estava preparado para grandes intervenções. O mundial foi só a oportunidade para os municípios aproveitarem as linhas de crédito para a execução de obras. Poucas delas interferem na Copa”, afirma Santos, do Ministério das Cidades.

O governo federal, em parceria com Estados e municípios, vem alocando recursos por meio do PAC para estimular a implantação de infraestruturas de sistemas de transporte público coletivo urbano. De 2010 a 2014 foram selecionados recursos para apoiar empreendimentos de mobilidade urbana no país, como promoção da qualificação de sistemas e vias de transporte coletivo, implantação de metrôs e requalificação de corredores de ônibus com o Bus Rapid Transit (BRT), o Veículo Leve sobre Pneus (VLP) e o Veículo Leve sobre Trilhos. A expectativa é de que estas obras tragam melhorias para o sistema de transporte coletivo das cidades, além de reduzir o tempo de deslocamento da população, principalmente no trajeto entre a moradia e o trabalho.

A primeira etapa do programa contemplou oito cidades-sede da Copa do Mundo: Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife e Fortaleza. Foram selecionados projetos que somam R$ 27 bilhões do PAC da Mobilidade além dos R$ 93 bilhões previstos inicialmente pelo programa de Mobilidade Urbana.

A segunda etapa do PAC da Mobilidade está em andamento e inclui 26 capitais e cidades com população entre 400 mil e 700 mil habitantes. Catorze municípios com mais de 700 mil habitantes, em uma lista que inclui Campinas, Guarulhos, Belém e Goiânia e também outras cidades-sede do mundial, como Brasília, foram contempladas em seguida. Agora estão sendo selecionados projetos em 26 cidades com mais de 400 mil habitantes.

“Dos R$ 143 bilhões destinados à mobilidade urbana, R$ 120 bilhões já foram destinado a projetos em execução ou em obras. Os R$ 23 bilhões restantes estão reservados a projetos que agora estão em análise. Obra de mobilidade tem um tempo médio de execução de cinco anos”, diz Santos.

 

TRANSPORTE SOBRE TRILHOS AVANÇA EM RITMO LENTO

Suzi Katzumata

Entre os transportes públicos de massa, o sistema ferroviário – trens urbanos e regionais, monotrilho e metrô – se destaca pela eficiência, capacidade de transportar um grande número de passageiros e pela maior durabilidade – a vida útil de um vagão de metrô é de 35 anos, enquanto que a de um ônibus urbano é de 12-15 anos. No entanto, sua expansão nas grandes cidades brasileiras se dá a passos de tartaruga. Custo elevado de implantação, tempo de obra prolongado e complexidade do planejamento do sistema são fatores que pesam contra o trem em comparação ao ônibus na hora do poder público tomar a decisão de investimento. Mas, para especialistas do setor, o que de fato impede o avanço dos trilhos no país é o excesso de burocracia e a falta de vontade política em todas as esferas do governo: municipal, estadual e federal.

Em uma tentativa de começar a mudar esse quadro, em 2010, o governo federal lançou o PAC Mobilidade Urbana, que inclui vários projetos de trens urbanos, metrô e monotrilho. “A presidente Dilma Rousseff anunciou que o principal investimento do governo federal serão os trilhos”, observou Pedro Torres, gerente de políticas públicas do ITDP Brasil.

O PAC Mobilidade Urbana previa, por exemplo, investimentos em metrô em Belo Horizonte, Curitiba, Brasília, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e Salvador, cidades-sedes da Copa. Em São Paulo, o monotrilho São Bernardo do Campo-São Paulo foi incluído no PAC. Porém, até agora pouca coisa saiu de fato do papel, cerca de 10% a 20% do previsto segundo estimativas do setor, frustrando empresas e passageiros.

“Quando surgiu esse movimento do PAC, havia de 10 a 15 projetos com potencial no setor ferroviário, mas apenas dois ou três saíram do papel”, disse Adelson Martins, diretor da divisão ferroviária da Voith. “Tudo aquilo em que havia a expectativa de ser construído para a Copa ficou para os Jogos [do Rio 2016] e agora para depois dos Jogos”, de acordo com Martins. Sem citar números, ele disse que a lentidão com que os projetos são tocados já levou a Voith a rever seus planos de investimento no país. “É um desafio para uma empresa multinacional como a Voith fazer um planejamento no Brasil desse jeito.”

A falta de investimentos em sistemas de transportes sobre trilhos por várias décadas teve como efeito o desmantelamento da cadeia de fornecedores de produtos e serviços no país. O resultado é que quase tudo agora precisa ser importado para atender os projetos de construção e ampliação, o que encarece ainda mais a conta. “Até 1996, a CSN produzia trilhos, mas com a ausência de investimentos para o setor a empresa parou a produção. Hoje o Brasil importa 100% dos trilhos. É preciso incentivar a produção nacional para baixar esse custo”, diz Torres.

O professor Márcio de Almeida D’Agosto, coordenador do Programa de Engenharia de Transportes (Coppe/UFRJ), observa que o problema para as empresas do setor é a falta de demanda para os seus produtos, uma vez que a atual taxa de crescimento no Brasil é de apenas “1 km de metrô a cada 40 anos”.

Já a outra demanda, de passageiros, é o que não falta no país. Segundo D’Agosto, tudo o que se faz hoje em transporte público no Brasil é para compensar um atraso de 30/40 anos, por isso as novas linhas já entram em operação completamente saturadas. No caso do metrô, ele estima que o país “teria de mais ou menos dobrar a capacidade existente a cada ano, por dez anos, para aí então chegar a algum lugar”.

Por isso, D’Agosto critica o pensamento que vincula o planejamento de um sistema em função das expectativas atuais de demanda. “A demanda de passageiros existe e quando um sistema é colocado em funcionamento, ele fomenta a demanda”, diz.

Enquanto os projetos do PAC seguem em marcha lenta, a expectativa para o setor ferroviário está agora sobre os planos de trens regionais, como São Paulo-Jundiaí, São Paulo-Sorocaba, São Paulo-Santos e Goiânia-Brasília.

“A bola da vez hoje são as linhas para fazer a conexão entre cidades. Os trens regionais são uma solução para desafogar os grandes centros urbanos”, diz Adelson Martins. Ele afirma que os governos estaduais estão muito interessados em viabilizar esses projetos através de parcerias público-privadas (PPP). Segundo ele, as rotas citadas estão em fase de estudo de viabilidade, sendo que em alguns casos, como SP-Jundiaí, já foram realizadas as primeiras audiências públicas.

 

CALENDÁRIO DE OBRAS NO RIO É FAVORECIDO

Chico Santos

Graças à sua escolha para sediar a final da Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos de 2016, o Rio de Janeiro é hoje a cidade brasileira com a maior programação de obras, parte delas já executada, destinadas a melhorar a qualidade dos transportes públicos. São R$ 17,4 bilhões em investimentos programados para estar prontos até 2016, sendo o mais expressivo deles a construção da Linha 4 do Metrô, com 16 quilômetros de extensão, orçada em R$ 8,79 bilhões.

Além da ampliação do Metrô, hoje com 41 km de extensão distribuídos por duas linhas, as principais intervenções previstas para a cidade são as construções de quatro linhas de BRT, sigla inglesa para Bus Rapid Transit, um sistema de ônibus articulados em linhas segregadas nascido em 1979 em Curitiba, e hoje implantado em várias cidades do mundo. Os BRTsTransoeste (dividido em duas etapas), Transcarioca, Transolímpica e Transbrasil têm orçamento oficial de R$ 7,5 bilhões e terão, juntos, 152 km de extensão, prevendo o transporte diário de 1,32 milhão de passageiros.

O Rio optou por fazer BRT em vez de novas linhas do Metrô por entender que o sistema criado pelo arquiteto e urbanista Jaime Lerner é mais rápido de ser construído, mais barato e mais flexível do ponto de vista de mudanças de tecnologias. Mas a opção, que já tem operando a primeira etapa do BRT Transoeste, com 52 km entre Santa Cruz e o Terminal Alvorada (Barra da Tijuca), tem recebido críticas de especialistas como o engenheiro Fernando Macdowell, ex-diretor do Metrô e professor da PUC-Rio.

Macdowell afirma que a solução adequada seria o metrô, até porque a cidade tem um desenho longitudinal, exigindo poucas linhas para atender os principais eixos. Para ele, o BRT é poluente, tem capacidade de transporte apenas média, quando os grandes corredores exigem alta capacidade.

O economista Sérgio Besserman, presidente da Câmara Técnica de Desenvolvimento Sustentável e de Governança Metropolitana do município do Rio de Janeiro e também professor da PUC-Rio, concorda que a universalização do metrô seria o ideal, mas argumenta que metrô é muito caro e demora demais a ficar pronto. “Nós não temos tempo”, argumenta.

De acordo com a Secretaria de Transportes da cidade do Rio de Janeiro, O BRT Transoeste, inaugurado em junho de 2012, reduziu em 40% o tempo de viagem para 150 mil passageiros/dia entre o bairro de Santa Cruz, no extremo oeste da cidade, até a Barra da Tijuca, a 52 quilômetros de distância. Em 2016 ele receberá mais seis quilômetros, atravessando o trecho mais denso da Barra, entre o Terminal Alvorada, fim de linha atual, e o Jardim Oceânico, estação final da Linha 4 do Metrô, sendo concluído a um custo total de R$ 2,1 bilhões.

Antes da abertura da Copa do Mundo será inaugurado o BRT Transcarioca, ligando a Barra da Tijuca, na zona oeste, ao Aeroporto Internacional do Galeão, na Ilha do Governador (zona norte), com 39 km de extensão e intersecção. Está previsto que todas as suas 47 estações e cinco terminais, reduzindo o tempo de viagem em 60% para 320 mil passageiros/dia. A obra está orçada em R$ 1,7 bilhão, mas deverá custar R$ 200 milhões a mais.

Para 2016 estão previstas as conclusões dos BRTsTranscarioca e Transbrasil. O Transolímpica, segundo a Secretaria de Transportes do município, com 23 km de extensão, 17 estações e três terminais, vai ligar o Recreio dos Bandeirantes a Deodoro, ambos na zona oeste. Deverá transportar 70 mil passageiros/dia.

 

Origem: Valor Econômico, 26/05/2014

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