Megalópoles devem conter a expansão territorial

Chico Santos

As grandes aglomerações urbanas precisam, a partir de agora, ganhar densidade e conter a expansão territorial desenfreada, facilitando as condições para que sejam prestados serviços de qualidade às suas populações. Esta é a concepção majoritária, segundo especialistas ouvidos pelo Valor, no Brasil e no mundo e que deveria nortear as ações dos gestores. “A ideia de reduzir a mobilidade, levando a moradia para perto do emprego, não tem amparo no pensamento atual”, afirma o arquiteto e urbanista Sérgio Magalhães, presidente dos Arquitetos do Brasil (IAB) e um dos principais estudiosos do tema no país.

De acordo com Magalhães, os estudos feitos nos últimos 15 anos levaram a constatações que mudaram a forma de ver a vida nas cidades. Uma foi a de que elas são os principais núcleos das trocas internacionais. A outra foi a de que elas não podem expandir indefinidamente seus territórios, seja porque isso é antieconômico, seja porque é agressivo ambientalmente, “queimando” territórios virgens e queimando literalmente mais e mais energia.

A expansão das cidades, que não param de crescer especialmente em países em desenvolvimento, como a China, fará com que, em 2025, quando 61% da população do planeta será urbana, haja no mundo 527 cidades com mais de um milhão de habitantes, dois terços delas nos países mais pobres, segundo estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU).

Já existem hoje no mundo pelo menos 23 megacidades (com mais de 10 milhões de habitantes), 15 delas em países pobres ou emergentes, e outras seis que podem já ter alcançado ou que alcançarão a qualquer momento esse piso, sendo quatro (Lima, no Peru, Bogotá, na Colômbia e Bangalore e Chennai na Índia) na parte mais pobre da terra.

Encontrar soluções para melhorar a qualidade da vida nessas aglomerações e fazer com que elas contribuam para a preservação dos recursos naturais é trabalho que vem absorvendo organismos multilaterais, como o grupo de cidades C40 de Liderança Climática, e centros de pensamento, como a London SchoolsofEconomics (LSE) que realiza o seminário itinerante Urban Age (o de 2013 foi no Rio de Janeiro) em parceria com o Deutsche Bank, e o Institut d’études politiques (SciencesPo) de Paris, entre outros.

Segundo Magalhães, do IAB, a mobilidade precisa estar apoiada em uma multiplicidade de modais de transporte, do metrô à bicicleta. Mas essa mobilidade, ressalta ele, não deve ser pensada apenas como aquela que atende ao trajeto de casa para o trabalho e do trabalho para casa. “Hoje, o fluxo casa-trabalho-casa corresponde a apenas metade da mobilidade”, pondera. Os outros 50% correspondem a trânsito para lazer, compras, estudos, saúde (médico) e outras necessidades urbanas.

O trajeto casa-trabalho-casa demanda transporte de alta intensidade, como trens e metrôs, enquanto os outros deslocamentos exigem veículos menores (VLTs, ônibus, automóveis e bicicletas), interligados aos maiores, formariam idealmente uma teia. Só que os deslocamentos nas cidades que exigem veículos correspondem a apenas dois terços do total, sendo o restante feito a pé. “Então, é necessário espaço público de qualidade para o pedestre”, completa.

No Brasil, de acordo com a avaliação do presidente do IAB, o crescimento das cidades tem ocorrido geralmente, com expansão territorial e apoiado em ônibus ou no automóvel para o segmento de renda mais alta. Segundo ele, os governantes não aprenderam com o mau exemplo do Centro Administrativo da Bahia (CAB), em Salvador, construído na década de 1970 e que expandiu enormemente a cidade, especialmente com moradias de baixa qualidade.

Exemplos recentes estariam andando no mesmo rumo, como construção da Prefeitura de Goiânia na periferia e do centro administrativo de Minas Gerais em uma área da Região Metropolitana de Belo Horizonte que era pouco povoada. Em relação aos transportes, ele acha que a opção do Rio de Janeiro pelo sistema de ônibus articulados (BRT) em vez de metrô está colocando um transporte de média intensidade onde deveria ser servido por um de alta.

O secretário de Transportes do Município do Rio de Janeiro, Alexandre Sansão, discorda de Magalhães sobre o BTR e afirma que já ficou comprovado em cidades como Bogotá (Colômbia) que o BRT bem operado pode transportar mais passageiros do que o metrô em horários de pico.

O economista Sergio Besserman, especialista em problemas urbanos e ambientais, que preside a Câmara Técnica de Desenvolvimento Sustentável e de Governança Metropolitana do Rio de Janeiro, acha que do ponto de vista da mobilidade a prioridade do Rio deveria ser o sistema de trens metropolitanos, que já existe e só precisa ser recuperado. Ele concorda que o metrô é a melhor opção, mas acha que o BRT foi uma boa saída por ser mais barato, mais rápido de fazer e mais flexível em termos de troca de equipamento.Para Besserman, o futuro das grandes cidades gira em torno do eixo da mudança climática que, na sua avaliação, é inevitável e já está em andamento. As cidades, especialmente nas suas áreas mais pobres, devem ser adaptadas para contribuir o mínimo para a aceleração desse evento e para enfrentar com o mínimo de danos à população os desastres naturais.

Besserman avalia que no prazo máximo de cinco anos as grandes cidades brasileiras terão que implantar algum tipo de pedágio para coibir o acesso do automóvel às suas regiões centrais, mas a medida precisa ser precedida da oferta de transporte público de qualidade. O secretário Sansão concorda.

Origem: Valor Econômico, 26/05/2014

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