Hannes Winkler: ‘O brasileiro detesta planejar’

Hannes Winkler, consultor de logística: ‘O brasileiro detesta planejar’ – Leo Martins / Agência O Globo

Especialista alemão foi destaque do Megacities que, esta semana, encerrou no Rio o ano da Alemanha no Brasil abordando grandes eventos esportivos

‘Sou engenheiro com doutorado em Logística e, há oito anos, vivo em Niterói, onde ainda espero o metrô chegar… Tenho 40 anos, sou casado com uma brasileira e pai de dois filhos nascidos no Brasil. Em julho volto para a Alemanha com minha família para dar aulas em Stuttgart. Já estou com muitas saudades’.

Conte algo que não sei.

A logística nasceu na arte da guerra, para fornecer armas e comidas às tropas. É uma disciplina muito antiga, que vem do tempo das pirâmides, os romanos etc. Sem logística eles não iam conseguir.

Como planejar um grande evento de forma sustentável?

A boa logística é sempre sustentável porque tenta evitar desperdício.

Mas, com a pressa, o meio ambiente fica de lado.

As empresas, em geral, só olham para os lucros. Economizam energia e água para não terem gastos. É raro abraçarem a sustentabilidade só pelo “bem’’. Se o segmento de moda consegue mais clientes sendo sustentável, aí vale. É o governo que tem de mudar as regras. Na Alemanha, se sua casa gasta muita energia você paga multa. Muita gente põe aquecimento solar e ganha incentivo. Num país que tem muito menos sol que o Brasil! Regras têm que ter consequências para quem não as cumpre.

Quais são os desafios de megaeventos como a Copa?

Dos equipamentos de mídia, milhares de toneladas de vários países, aos uniformes tudo tem que estar na hora certa, no lugar certo, funcionando. A Puma mandou erradas as camisas de Camarões e Chile. Os chilenos estão furiosos. Da logística boa ninguém sabe, mas quando algo dá errado… A Alemanha vai ficar num hotel construído só para ela. Mas é perto de Porto Seguro e a equipe vai ter que pegar uma balsa. Tomara que funcione.

Qual a sua avaliação da logística para a Copa no Brasil?

Estava na Alemanha em 2006. O desafio do Brasil é muito maior. Lá as distâncias são pequenas e já havia metrô, estádios, trens. Aqui há um acúmulo de atrasos, mas isso também aconteceu na África do Sul. Acho que tudo vai correr bem. Mas logística não é só o tempo, mas também qualidade e custos. Aqui os custos explodiram, e isso é mais preocupante do que os atrasos.

Como aferir qualidade?

A qualidade a gente vai ver ao longo dos próximos anos, se os estádios vão precisar de reformas logo, o que vai ficar dos BRTs… Mas, para não parecer o alemão que fala mal do Brasil, na Alemanha também estamos sofrendo com o aeroporto de Berlim, do qual não temos orgulho. Estou aqui há oito anos e vi muita coisa positiva.

Por favor, diga o quê.

Estão fazendo, finalmente, um metrô para a Barra. Ainda estou esperando um metrô para Niterói (risos). Ao mesmo tempo, não sei se vai melhorar tanto porque a cidade está crescendo muito. Esses investimentos são mais para manter como está, para não piorar. Mas haverá algum legado. Se a área do Porto do Rio chegar perto de Porto Madero, de Buenos Aires, e do bairro do porto de Barcelona será maravilhoso. Sou otimista.

Compare o ensino de logística daqui com o alemão.

Dou aula de sistemas produtivos no mestrado em engenharia industrial da PUC-Rio. Aqui só há especialização, mas não uma graduação, como na Alemanha. Seria bom para o Brasil ter mais educação na área. Para entender que logística é muito mais do que transporte. O alemão gosta muito de planejar, mas não é tão bom em improvisar. Já o brasileiro detesta planejar, mas é muito bom em improvisar. Talvez um possa aprender com o outro.

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