Bairro planejado atrai com promessa de valorização, mas também há riscos

Sergio Tauhata, Valor Econômico

O mercado costuma enxergar valor diferenciado em produtos sob medida, como roupas e móveis. E por que não um bairro inteiro? Embora a ideia não seja exatamente nova, projetos do gênero têm agradado incorporadoras e investidores – pelo menos por enquanto.

Uma nova onda de bairros planejados chega às metrópoles em um momento no qual o mercado imobiliário como um todo desacelera. Empreendimentos que reúnem infraestrutura projetada, como parques, vias de acesso e centros de lazer, além de condomínios residenciais, prédios comerciais, serviços, shoppings e até hotéis têm chamado a atenção de investidores em busca de renda ou ganhos com valorização.

Os mais recentes projetos vêm sendo comercializados com muita rapidez. A primeira fase do Jardim das Perdizes, empreendimento na capital paulista da incorporadora Tecnisa em parceria com a PDG, lançado em março com apartamentos de 159 m2 a 283 m2, teve 86% das unidades vendidas no primeiro fim de semana.

“Um dos maiores, o de 283 m2, foi o primeiro a ser vendido. Um cliente assinou o contrato no mesmo dia da visita”, afirma Mirella Parpinelle, diretora de atendimento da Lopes, única imobiliária que comercializa o empreendimento junto com as áreas de vendas das incorporadoras. “E são unidades com ‘ticket’ médio de R$ 1,5 milhão.”

O Parque da Cidade, projetado pela Odebrecht Realizações Imobiliárias (OR), gerou também alto grau de interesse. Em menos de uma semana, todas as 615 unidades comerciais da primeira fase foram vendidas.

O empreendimento lançado em setembro do ano passado no Brooklin, em São Paulo, reunirá torres comerciais, residenciais, shopping, hotel e um parque aberto ao público que integra todo o complexo.

Além do Parque da Cidade, a OR lançou mais quatro empreendimentos do gênero em Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro e Bahia. O maior é a Reserva do Paiva, no Recife, implantado em uma área de 5,2 milhões de m2 e com 18 etapas a serem lançadas, uma a cada ano.

Na primeira fase, em 2009, foram vendidas 66 casas por valores entre R$ 1,5 milhão a R$ 4 milhões. O projeto prevê ainda a instalação de torres empresariais, shopping, um hotel e um resort, além de campo de golfe, marina, academia de tênis e de futebol.

“Cada etapa vai agregar um valor novo. Então o potencial de ganho é expressivo. Quanto antes se entra no projeto, maior o ‘upside’, ou seja, a margem de valorização”, afirma Paulo Aridan Mingione, diretor regional da Odebrecht Realizações.

A mesma estratégia é empregada no Jardim das Perdizes. Segundo Fabio Villas Bôas, diretor executivo técnico da Tecnisa, na primeira fase, o m2 chegou a ser inferior ao de bairros adjacentes. Mas, a cada etapa, o preço pode subir de acordo com a demanda e o desenvolvimento do projeto e “a tendência é a de superar a valorização média das áreas imediatamente vizinhas”.
Embora o potencial de valorização seja alto, os riscos de empreendimentos do gênero são justamente o de não haver demanda e de os preços caírem. “Quanto antes o comprador entra, mais exposto à possibilidade de algo dar errado ele fica”, afirma Luiz Paulo Pompéia, da Empresa Brasileira de Estudos do Patrimônio (Embraesp).

Para o especialista, se houver alta excessiva dos preços, uma “bolha” localizada, por exemplo, há risco de prejuízo. “Há projetos com mais de uma dezena de edifícios. Será que a incorporadora consegue ocupar todos os apartamentos com valores acima de um milhão de reais?”.

Na visão de Pompéia, outro risco é de a percepção de valor não se confirmar. “No projeto, uma área de lazer pode parecer ótima, mas, dependendo do adensamento, pode estar subdimensionada. Além disso, a localização muitas vezes é vendida como diferencial e, na prática, acaba se revelando mais complicada.”

Apesar dos riscos, os bairros sob medida lançados nos últimos anos alcançam até 94% de ganho sobre regiões próximas, de acordo com levantamento da Fipe/Zap (ver quadro). Mesmo o Jardim das Perdizes, em apenas dois meses, acumula uma diferença positiva de 14%, comparado ao m2 da vizinha Perdizes.

De olho no potencial dos projetos planejados, investidores têm marcado presença entre os primeiros compradores dos empreendimentos paulistanos. De acordo com a Lopes, 10% dos clientes adquiriram mais de uma unidade na primeira etapa do Jardim das Perdizes.

Já no Parque da Cidade, 45% dos compradores dos espaços comerciais declararam ter adquirido o imóvel para locação, segundo a Odebrecht. E outros 25% revelaram que o principal motivo para fechar o negócio foi a perspectiva de valorização.

Na avaliação do presidente da Zap Imóveis, Eduardo Schaeffer, o surgimento desses complexos, que juntam comércio, moradia e serviços, deve ganhar força nos próximos anos.

“É uma tendência. São propriedades naturalmente mais valorizadas. O consumidor enxerga vantagens na organização, na segurança e na conveniência de resolver a vida lá mesmo”, afirma.

Vicente Giffoni, presidente da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (Asbea-RJ), acredita que bairros planejados podem se valorizar até 40% acima de empreendimentos convencionais.

“Esses ‘lifestyles centers’, como são chamados no exterior, estão mais resguardados da deterioração urbana, porque os administradores têm domínio da qualidade da infraestrutura.”

Um casal – um advogado e uma engenheira – que comprou um apartamento no Jardim das Perdizes, mas pediu para não ser identificado, conta que o parque de 50 mil m2 previsto para ser instalado no centro do novo bairro foi “o principal motivo da escolha”. O advogado espera uma valorização de 20% quando a obra for entregue.

Um fator que reforça a demanda pelos bairros planejados é a escassez de terrenos nas metrópoles, pondera Pompéia, da Embraesp. “Em São Paulo, esses projetos são muito difíceis de acontecer. Jardim das Perdizes e Parque da Cidade são áreas raras dentro da capital”, afirma.

Segundo Pompéia, empreendimentos do gênero exibem como atrativo “uma urbanidade mais sensata”, como sistema viário planejado para atenuar o fluxo de carros e uma infraestrutura que traga mais conforto aos moradores.

“No bairro planejado, as pessoas sabem como a área vai ser no futuro. A previsibilidade se torna um fator importante para o cidadão decidir ir morar lá.”