Subir, ou não subir: essa é a questão!

O artigo abaixo foi escrito pela arquiteta Sandra Sayão, sócia da De Fournier & Associados, e publicado no Jornal O Globo de 8/6/2012.

É uma opinião, do ponto de vista arquitetônico, sobre a discussão a respeito do aumento de gabarito na área portuária, que vem sofrendo um precesso de revitalização.

Segue o artigo na íntegra:

“A Cidade do Rio de Janeiro, motivada pelos eventos da Copa do Mundo e Olimpíadas, entre outros fatores de impulso econômico, é palco de uma releitura urbana. Surge aquela vontade política e privada em revigorar a autoestima da Cidade. Após longo período de congelamento das revitalizações, a Zona Portuária vive uma concreta oportunidade para sua requalificação e reintegração à Cidade. Entretanto, em paralelo, passa por momentos importantes de reflexões e questionamentos. A Av. Perimetral, a exemplo relevante, transformou por muitos anos a estética do Cais do Porto. Sob a larga laje do elevado e entre o ritmo de seus robustos pilares, abriga espaços urbanos sombrios e degradados que provocaram a segregação deste setor do contexto urbano. O traçado extenso do elevado que cobre uma grande fatia da Cidade, há mais de 20 anos, provoca divergentes discussões sobre os benefícios ou malefícios que gerou para a Cidade. Hoje, prestes a ser removido, ainda divide a opinião pública entre sua demolição e o papel importante que exerce na fluidez do deslocamento urbano. A população ainda divide opiniões sobre esse assunto, mas, entretanto, todos na mesma intensidade anseiam o resgate dos espaços públicos perdidos pela degradação. No momento em que a Cidade recuperar seu patrimônio natural retomando a frente mar, e ofertar à população espaços atraentes e arejados, iremos todos esquecer os transtornos e questionamentos do passado, frente aos surpreendentes benefícios que virão.

O processo de revitalização muda os paradigmas sociais, buscando a reocupação urbana, a solução de trânsito e a criação de transportes de massa, além de casar tudo isso aos resultados matemáticos econômicos para seu sucesso. Sendo assim, então pergunto: congelar a leitura de uma célula que fervilha a oportunidade de sua recuperação e faz parte do organismo vivo de uma Cidade, é o caminho?

A liberação do gabarito neste setor de 18 para 33m tem sido pauta de várias discussões. E sendo mais específico, o foco no momento aponta para o terreno do Banco Central. Concordo com Adauto Lúcio Cardoso, que defende o direito de igualdade para todos. A Lei com certeza garante esse direito. No entanto, será errado nos defrontarmos com propostas pontuais, que abrem a oportunidade para legados arquitetônicos mais emblemáticos?  O prédio em questão, não poderia assumir a função de marco na paisagem da Cidade? Isto seria ruim?

O cenário de uma Cidade hoje é muito dinâmico. A composição das tomadas visuais, a permeabilidade dos ventos, a relação do uso público com os térreos e embasamentos, a arte e o comportamento cultural de uma Cidade, a tecnologia, a globalização, a preocupação com a sustentabilidade, entre outros itens, contribuem para este dinamismo. O que não podemos repetir nesta região, são os erros cometidos no passado. Acreditando que a arquitetura é um mero espelho das redações que compõem as leis urbanas. A arquitetura é mais que isso, é criatividade, ousadia, dinamismo e principalmente sensibilidade. Isso não significa que iremos abandonar as posturas legais da Cidade, longe disso. O que não podemos desprezar é que os grandes saltos da arquitetura surgiram das releituras provocadas por grandes fóruns de questionamentos. Achar a linha tênue entre o ideal e o desejo para o que está prestes a nascer na Zona Portuária é o que aguça a criatividade que irá enriquecer o resultado da futura paisagem de nossa Cidade.”

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